sábado, 21 de maio de 2011

20 cm de vida

- 20 cm, soutora, não será muito?
- Há que começar devagar. Uma etapa de cada vez.
- E qual é a dieta, soutora?
- Ervilha e meia por dia e 1/3 de iogurte magro por semana.
- Não sei se consigo comer isso tudo.
- Tem de tentar. Não podemos exagerar. Alguma coisa terá de comer.
- Mas sinto-me tão gorda, soutora. Olhe, aqui, quando eu era mais nova, tão elegante que era.
- Onde?
- Aqui, atrás desta corda. Está a ver esta orelha? É minha.
- Muito elegante, sim, senhora. E fazia o pino de forma tão graciosa!
- O pino e outros malabarismos, verdade seja dita. Mas não é o caso. Os brincos é que eram demasiado pesados. De vez em quando tinha de pousar as orelhas para descansar.
- Raio dos brincos. Já tive o mesmo problema com um fio de prata.
- E o dinheiro que se poupava em roupa, soutora? Nem imagina. Olhe, de uma manga de camisa fazia dois vestidos. Bons tempos.
- Pronto, lá chegaremos. Tudo se há-de compor.
- Ai nem me diga, soutora. Mal posso esperar.
E saiu leve, profusa, irradiando esperança, sua graça difusa. Infelizmente, estava vento. Os brincos ficaram em casa - oh tragédia!
A doutora perdeu a doente, a mercearia abriu falência e nunca mais houve beleza no mundo.

2 comentários:

Di Almeida disse...

Este titulo deixou-me com a pulga atrás da orelha...

tediokiller disse...

Essa pulga atrás da orelha certa podia ter salvo a pobre da rapariga.